quinta-feira, 28 de maio de 2009

STJ julga primeiro recurso sobre responsabilidade de veículo de comunicação após revogação da Lei de Imprensa

"A divulgação de informações pela imprensa só pode ser considerada culposa se o veículo agir de forma irresponsável. Ao veicular notícia sobre suspeitas e investigações, em trabalho devidamente fundado, os órgãos de imprensa não são obrigados a ter certeza plena dos fatos, como ocorre em juízo. O entendimento é da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), ao julgar o primeiro caso após a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que, em argüição de descumprimento de preceito fundamental (ação utilizada para questionar a adequação de uma lei antiga a uma Constituição posterior) declarou ser inaplicável, em face da CF/88, a Lei de Imprensa (Lei n. 5.250/67). Como a Lei de Imprensa não pode mais ser aplicada, para alterar decisão condenando a Globo Participações S/A por reportagem no programa Fantástico que citou o jornalista Hélio de Oliveira Dórea como envolvido na 'máfia das prefeituras' no Espírito Santo e Rio de Janeiro, a ministra Nancy Andrighi se baseou apenas no Código Civil e na Constituição Federal, além de no Código de Ética dos Jornalistas. 'A elaboração de reportagens pode durar horas ou meses, dependendo de sua complexidade, mas não se pode exigir que a mídia só divulgue fatos após ter certeza plena de sua veracidade. Isso se dá, em primeiro lugar, porque a recorrente, como qualquer outro particular, não detém poderes estatais para empreender tal cognição. Impor tal exigência à imprensa significaria engessá-la e condená-la a morte', afirmou a relatora. 'O processo de divulgação de informações satisfaz verdadeiro interesse público, devendo ser célere e eficaz, razão pela qual não se coaduna com rigorismos próprios de um procedimento judicial', completou. Segundo a ministra, a reportagem registrou depoimentos de fontes confiáveis, como de testemunha que formalizou notícia-crime à polícia e de procurador da República. O próprio repórter passou-se por interessado nos benefícios do crime e obteve gravações que demonstravam a existência do esquema de fraudes apontado. 'Não se tratava, portanto, de um mexerico, fofoca ou boato que, negligentemente, se divulgava em cadeia nacional', explicou a relatora. Além disso, o advogado de Dórea fora ouvido e sua afirmação, negando qualquer ligação ou prova contra o jornalista, veiculada. Dórea havia ganho em primeira instância indenização de R$ 100 mil por danos morais e R$ 6,5 milhões por danos materiais. O tribunal local determinou a revisão do valor dos danos materiais, para que fosse apurado na fase de execução. Mas, pelo entendimento da Terceira Turma do STJ, a veiculação analisada não configura abuso da liberdade de imprensa nem viola direitos do autor da ação. Para o Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJES), teria ocorrido abuso do direito de informar, tendo a Globo agido com ânimo de difamar e caluniar. 'A simples pecha de suspeito atribuída [...] já se faz conduta suficiente a ensejar danos à honra objetiva (social) e subjetiva (íntima) do autor, merecendo, assim, repreensão judicial', registra a decisão. Mas, no entendimento da relatora do recurso no STJ, a reportagem em nenhum momento fez afirmação falsa: indicava que Dórea era suspeito de pertencer à organização criminosa que, por sua vez, era suspeita de assassinar um advogado. Por isso, argumentou a ministra, 'não basta a divulgação de informação falsa, exige-se prova de que o agente divulgador conhecia ou poderia conhecer a inveracidade da informação propalada'. 'O veículo de comunicação exime-se de culpa quando busca fontes fidedignas, quando exerce atividade investigativa, ouve as diversas partes interessadas e afasta quaisquer dúvidas sérias quanto à veracidade do que divulgará. Pode-se dizer que o jornalista tem um dever de investigar os fatos que deseja publicar', acrescentou. A ministra Nancy Andrighi afirmou ainda que, por mais dolorosa que fosse a suspeita que recaía sobre o jornalista, à época da reportagem ela realmente existia, tanto que a justiça determinou até mesmo busca e apreensão em uma empresa sua. 'Se hoje já não pesam sobre o recorrido essas suspeitas, isso não faz com que o passado se altere. Pensar de modo contrário seria impor indenização a todo veículo de imprensa que divulgue investigação ou ação penal que, ao final, se mostre improcedente', concluiu".

Fonte:

2 comentários:

Anônimo disse...

oi, cleber.
a prefeita rosinha já está brigando com sua procuradoria!
na 2 vara civel de campos tem mandado de segurança
2009014014900-0, com liminar em favor dos mesmos.

Sérgio Provisano disse...

Muito interessante esse julgamento do recurso sobre a responsabilidade de veículo de comunicação após a revogação da malfadada lei de imprensa, um dos últimos entulhos autoritários da nefasta ditadura militar.

Seu post, doutor Cleber, tem, no meu limitado entendimento, um caráter doutrinário, uma verdadeira aula de Direito por assim dizer e o parecer aponta como deverá ser o entendimento da Justiça em relação à casos futuros que certamente irão ao Judiciário, balizando as futuras decisões com certeza.