quarta-feira, 16 de março de 2011

A ilegalidade na cobrança de tarifa de esgoto não tratado

O serviço público de fornecimento de água e de coleta e tratamento de esgoto compete ao Município, salvo se este vier a integrar região metropolitana (art. 25, § 3º, da Constituição Federal).

O serviço pode ser executado diretamente pelo Município ou indiretamente, mediante delegação. Comumente a prestação do serviço é delegada a um particular, por meio de contrato de concessão.

Em Campos, o fornecimento de água, coleta e tratamento de esgoto está a cargo da empresa Águas do Paraíba, com base em contrato de concessão firmado com o Município

A relação entre o usuário e a concessionária submete-se aos preceitos do Código de Defesa do Consumidor. Estes serviços são remunerados por meio de tarifa, cuja cobrança é feita diretamente pela empresa concessionária de seus usuários, o que pressupõe a efetiva prestação do serviço (art. 22, do Código de Defesa do Consumidor e art. 3º, I, "b", da Lei 11.445/2007).

Apesar de muito questionável, o valor da tarifa de esgoto corresponde a tarifa de água utilizada. Na prática, paga-se a tarifa de água duas vezes. Entretanto, o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, com base na Lei 11.445/2007 e no CDC, vem reconhecendo a ilegalidade na cobrança de tarifa quando o esgoto não é tratado, como demonstram os arestos abaixo

0005736-32.2007.8.19.0007 - APELACAO - 1ª Ementa DES. MARCIA ALVARENGA - Julgamento: 02/03/2011 - DECIMA SETIMA CAMARA CIVEL APELAÇÃO CÍVEL. PROCEDIMENTO ORDINÁRIO. COBRANÇA DE TARIFA DE ESGOTO SANITÁRIO EM CONTA DE ÁGUA DO CONSUMIDOR. CONCESSIONÁRIA QUE NÃO PRESTA SERVIÇO DE TRATAMENTO DE ESGOTO, MAS SOMENTE COLETA E TRANSPORTA. NÃO CUMPRIDA A INTEGRALIDADE DO SERVIÇO, NÃO SE JUSTIFICA O PAGAMENTO DO PREÇO PÚBLICO. DEVOLUÇÃO EM DOBRO DOS VALORES INDEVIDAMENTE COBRADOS. PRAZO PRESCRIONAL APLICÁVEL DEFINIDO PELO CÓDIGO CIVIL, CONFORME SÚMULA N. 412 DO STJ. RECURSO DA SEGUNDA APELANTE A QUE SE NEGA SEGUIMENTO, RECURSO DOS PRIMEIROS APELANTES A QUE SE DÁ PARCIAL PROVIMENTO.

0002444-39.2007.8.19.0007 - APELACAO / REEXAME NECESSARIO DES. HELENA CANDIDA LISBOA GAEDE - Julgamento: 02/03/2011 - DECIMA OITAVA CAMARA CIVEL APELAÇÃO. COBRANÇAS DE TARIFA DE ESGOTO. RECONHECIMENTO DA DEVOLUÇÃO DAS TARIFAS RELATIVAMENTE AOS DEZ ANOS ANTERIORES A PROPOSITURA DA DEMANDA. A NOVA LEI SOBRE SANEAMENTO BÁSICO (LEI Nº 11.455) DEFINE EM SEU ART. 3º, I, 'B', QUE SERVIÇO DE ESGOTAMENTO SANITÁRIO É CONSTITUÍDO PELAS ATIVIDADES, INFRA-ESTRUTURAS E INSTALAÇÕES DE COLETA, TRANSPORTE, TRATAMENTO E DISPOSIÇÃO FINAL ADEQUADOS DOS ESGOTOS SANITÁRIOS, DESDE AS LIGAÇÕES PREDIAIS ATÉ O SEU LANÇAMENTO FINAL EM SEU MEIO AMBIENTE. POR NÃO PRESTAR A RÉ A ATIVIDADE PRINCIPAL, QUE É O TRATAMENTO DO ESGOTO, O PAGAMENTO PELO SERVIÇO INEXISTENTE REVELA-SE INDEVIDO. PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO DO AUTOR, NA FORMA DO ARTIGO 557,§1-A DO CPC E NEGADO SEGUIMENTO AO RECURSO DO RÉU, NA FORMA DO ARTIGO 557, CAPUT DO CPC.

De acordo com a jurisprudência, o consumidor pode exigir a devolução em dobro do que pagou indevidamente, nos termos do art. 42, parágrafo único, do CDC.

Por outro lado, o consumidor pode recusar-se a pagar a tarifa de esgoto não tratado cobrada juntamente com a de água. E se a recusa levar ao corte no fornecimento de água, poderá o consumidor pleitear danos morais pela privação de serviço essencial:

DES. SIDNEY HARTUNG - Julgamento: 02/03/2011 - QUARTA CAMARA CIVEL AGRAVO INOMINADO na APELAÇÃO - DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE DÉBITO DA TARIFA DE ESGOTO REPETIÇÃO DE INDÉBITO - DANOS MORAIS - IMPUGNAÇÃO Decisão monocrática que deu parcial provimento ao recurso de apelação interposta pela demandada para excluir a devolução em dobro, considerando a restituição simples do indébito, mantendo-se, quanto ao mais, r. sentença, por seus próprios fundamentos. - Agravo Inominado repisando os mesmos argumentos anteriormente suscitados, postulando a reforma do decisum prolatado pelo Relator. Manutenção da decisão monocrática. - Bairro não dotado de serviço de tratamento de esgoto sanitário. - Cobrança indevida pela CEDAE. - Dano moral caracterizado e corretamente arbitrado pelo corte do fornecimento de água, serviço essencial à subsistência do ser humano, fundado em não pagamento de faturas que contêm parcela não devida. - Inaplicabilidade da restituição em dobro do art. 42 §único do CDC, diante da Súmula nº 85 do TJRJ. Prescrição vintenária, conforme art. 177 do Código Civil de 1916 c/c o art. 2028 do Código Civil atual. - Responsabilidade da concessionária em alterar o sistema para suprimir a cobrança. - No que concerne ao parcelamento da dívida, o mesmo é direito para quem preenche os requisitos previstos na Lei Estadual 4.339/2004. - Precedentes Jurisprudenciais. - Manifesta improcedência da apelação. - Acerto da decisão recorrida. - NEGADO PROVIMENTO AO RECURSO.

Por fim, cumpre esclarecer que o prazo para pedir a devolução do indébito é o estabelecido no Código Civil (20 anos pelo Código Civil de 1916 e 10 anos pelo Código Civil de 2002).