Antes de tecer alguns
comentários a respeito do edital de licitação do transporte coletivo de Campos,
cumpre-me esclarecer o que é uma concessão.
Em primeiro é preciso ter em
mente que o serviço público tem como titular um ente estatal (União, Estados,
Municípios ou Distrito Federal), mas seu exercício pode ser delegado ao
particular mediante concessão, que é um contrato administrativo.
A concessão de qualquer serviço
público deve ser precedida de concorrência, uma modalidade licitatória, a fim de selecionar a proposta mais vantajosa para a
coletividade. Neste processo de escolha, a Administração
Pública deverá fixar necessariamente os critérios para julgamento das
propostas, entre os seguintes elencados pelo art. 15, da Lei n.º 8.987/95:
Art. 15. No julgamento da licitação será
considerado um dos seguintes critérios:
I - o menor valor da tarifa do serviço público a ser
prestado;
II - a maior oferta, nos casos de pagamento ao poder
concedente pela outorga da concessão;
III - a combinação, dois a dois, dos critérios referidos nos
incisos I, II e VII;
IV - melhor proposta técnica, com preço fixado no edital;
V - melhor proposta em razão da combinação dos critérios
de menor valor da tarifa do serviço público a ser prestado com o de melhor
técnica;
VI - melhor proposta em razão da combinação dos critérios de
maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica; ou
VII - melhor oferta de pagamento pela outorga após
qualificação de propostas técnicas.
Na concorrência em questão o critério eleito foi o
do inciso VI, ou seja, “melhor proposta em razão da combinação dos critérios de
maior oferta pela outorga da concessão com o de melhor técnica”, conforme o preâmbulo
do edital. Note-se que não se utilizou o critério da menor valor da tarifa (que
é o valor a ser cobrado do usuário) do serviço a ser prestado.
A maior oferta pela outorga constitui a remuneração
oferecida pelo concorrente ao Poder concedente (Município de Campos) para ter a
concessão. Este critério não é bem visto nas concessões de transporte público
porque o pagamento da outorga é mais uma despesa a ser arcada pelo concessionário
com reflexo sobre as tarifas.
Neste sentido, opina Glaydson Santo Soprani Massaria,
Procurador do Ministério Público Especial junto ao Tribunal de Contas de Minas
Gerais:
“O pagamento da outorga é um valor entregue pelo licitante
vencedor ao poder concedente, como contrapartida ao direito de explorar o
serviço. Trata-se de instituto previsto no art. 15, II, VI, VII, da Lei de
Concessões.
Por se tratar de serviço essencial (art. 30, V, CR/1988),
o transporte coletivo deve ser oferecido ao usuário com o menor custo possível,
de forma a garantir a máxima efetividade da Constituição. Nesse sentido, o
Ministério Público de Contas rejeita a utilização do pagamento da outorga
nessas concessões, por consistir tal despesa em custos do operador com impacto direto
sobre a tarifa, contrariando o princípio da modicidade tarifária.”
Em matéria de concessões de transporte público, entende o
referido procurador que o melhor critério para seleção da proposta vencedora é
da menor tarifa, como se observa no trecho abaixo:
“Entende o Ministério Público de Contas que dentre os
critérios de julgamento previstos no art. 15 da Lei de Concessões, o único que
atende ao princípio da modicidade tarifária é o tipo licitatório menor tarifa.
Por esse critério o julgamento é realizado de forma eminentemente objetiva,
vencendo a licitação aquele que oferecer o serviço nos padrões da especificação
técnica com o menor custo possível.”
Mas por que não se adota este critério em Campos? Haveria
algum motivo para dispensá-lo?
Parece-me, no mínimo, contraditório valer-se de um critério
de pagamento de outorga, mantendo-se um programa de subvenção de passagem. O
Município e o concessionário seriam ao mesmo tempo credores e devedores um do
outro, em detrimento da população. Ora, se o critério da menor tarifa fosse
empregado, dispensando-se, portanto, o pagamento pela outorga, não me
impressionaria ver o programa de subvenção perder o sentido diante de propostas
que fixassem a passagem em R$ 1,00 em todo o município e para todos os usuários,
não apenas para os cadastrados como atualmente se faz.
Mas seria arriscar demais o crédito político auferido com
o programa, ainda mais que para o cidadão comum importa é pagar menos, sendo
irrelevante o fato de se empregar dinheiro público para subsidiar o uso do
transporte. Além disso, o pagamento da outorga seria mais uma boa receita para
o município, livre das amarras da legislação dos royalties que veda seu emprego
na remuneração de pessoal. Assim, com esta operação, o dinheiro para
subvencionar as empresas poderia ser oriundo dos royalties, ao passo que a
outorga seria remunerada com capital privado, podendo ser gasto com maior
liberdade.