sexta-feira, 23 de maio de 2014

Ainda sobre a polêmica doação de imóvel (terreno) à OAB


Em primeiro lugar, não é preciso ter acesso aos detalhes do processo administrativo para concluir pela ilicitude da doação realizada pelo Município de Campos em favor da OAB, pois o desvio de finalidade é flagrante.

O interesse público, o bem comum, o interesse geral deve sempre nortear a atividade administrativa. Dele não pode se desviar o administrador público no exercício de suas competências, porque o Estado existe para servir ao povo e não dele se servir para privilegiar quem quer que seja.

De acordo com Fábio Konder Comparato: "Numa república, ninguém pode exercer o poder em benefício próprio ou de grupos ou corporações às quais pertença, mas deve fazê-lo para a realização do bem público, que é o bem do povo (res publica, res populi)." (Ética: direito, moral e religião no mundo moderno/ Fábio Konder Comparato, Cia das Letras, p. 636).

Como se percebe, não é preciso descer a minúcias do negócio para concluir pela sua ilicitude, que não é afastada pelo compromisso de destinar a área não só ao desfrute dos advogados e de seus familiares, mas também à prestação de algum tipo de serviço público.

As declarações das autoridades envolvidas, expressando os motivos determinantes da doação, deixam claro que o interesse público ficou em segundo plano, com a agravante de que sequer se estabeleceu encargo na doação que obrigasse a OAB à prestação de serviço de interesse público, conforme trechos de duas reportagens abaixo:

"Os advogados de Campos e seus familiares vão contar com uma sede campestre para confraternização e recreação. Para viabilizar o antigo sonho dos profissionais da advocacia do município, a Prefeita Rosinha Garotinho decidiu doar uma área de 23,9 mil metros quadrados para construção do empreendimento de lazer. O anúncio foi feito na noite desta sexta-feira (11), pela prefeita durante a solenidade de reinauguração da sede executiva da 12ª Subseção da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), evento prestigiado por autoridades do município e dirigentes da sociedade civil organizada." (notícia divulgada no ano de 2009, na página oficial da PMCG).
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'O que era sonho hoje é uma realidade. Estamos aqui juntos, pisando pela primeira vez na área que será transformada no espaço de lazer de nossos advogados. Aqui nossas famílias poderão se reunir e os advogados poderão aproveitar das atividades de lazer e entretenimento', disse o presidente, que explicou ainda que irá buscar recursos para que as obras possam ser iniciadas em breve.
Segundo ainda o presidente, a instalação da sede social e esportiva da entidade é um sonho de cerca de 50 anos dos advogados de Campos. 'Vamos trabalhar bastante para que ainda neste ano possamos ter no local algumas atividades esportivas, com a construção da pista de atletismo e o campo de futebol. Vamos avançar, e a partir do ano que vem pretendemos ter já as quadras poliesportivas, a piscina para natação e lazer e em seguida, o espaço social, para solenidades diversas', concluiu Carlos Fernando.(notícia divulgada no site de notícias Ururau em 13/05)
Tais elementos são suficientes para concluir, sem leviandades ou retardos, que o motivo determinante da doação afastou-se do interesse público, violando, assim, princípios constitucionais, como o princípio republicano, da legalidade, da moralidade, além da própria Lei Orgânica, que em seu art. 106 subordina expressamente a doação ao atendimento do interesse público. Em verdade, como demonstram as notas jornalísticas acima, esse é um caso confesso de desvio de poder.




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